Nestes últimos tempos, uma nuvem negra de nome “inteligência artificial” tem pairado sobre a área da Tradução, assim como muitas outras áreas. Mas será mesmo essa nuvem metafórica sinal de mau presságio e motivo de preocupação? Ou será possível tirar partido da mesma?
Neste artigo, partilho a minha experiência com a ferramenta de inteligência artificial do momento: o ChatGPT.
O que é o ChatGPT?
Criado pela OpenAI, um laboratório de pesquisa de inteligência artificial norte-americano, o ChatGPT é um modelo pré-treinado com dados que vão até 2021, e que interage com o utilizador por meio de um chat. Esta ferramenta permite responder a várias perguntas, consegue admitir os próprios erros, questiona premissas incorretas e, inclusivamente, rejeita pedidos menos apropriados.
No fundo, é um cérebro gigante omnipresente, pronto para responder a quaisquer dúvidas.
O ChatGPT na Tradução
É difícil não encontrar comentários sobre como o ChatGPT irá facilmente substituir tradutores pelo mundo fora. Na minha ótica, atualmente, esta ferramenta ainda está longe de o fazer, e por dois grandes motivos:
- Falta de otimização:
- Atualmente, a interface não permite um método de trabalho muito produtivo. Em comparação com o DeepL, a ferramenta de inteligência artificial assumidamente de tradução, o ChatGPT não permite ver lado a lado o texto de partida e o texto de chegada. Para além disto, a velocidade de resposta não é sempre a melhor e podem ocorrer erros, obrigando o utilizador a reescrever ou a recopiar o texto.
- Em termos técnicos, a sua API também ainda demonstra algumas limitações ao nível de pedidos que podemos fazer e a quantidade de texto que podemos enviar e receber como resposta.
- Parcialidade:
- No relacionamento entre pessoas, é natural começarmos a traçar o perfil do outro e a compreender as suas qualidades e defeitos. Isto também acontece com o ChatGPT, que parece ter um grande defeito: tentar sempre agradar-nos. Em “bom estrangeiro”, é um “people pleaser”.
- Por mais mirabolante que seja a pergunta, o ChatGPT raramente nos dirá que não; começará afirmativamente todas as suas respostas, o que o torna por vezes bastante obstinado.
Exemplos de uso
Apesar destes problemas, esta ferramenta consegue ser bastante útil. Um dos casos que melhor exemplifica esta ideia é quando nos deparamos com algum filme, série ou programa com diálogos naturais, um registo e construção oral muito vincada, ou até palavreado técnico.
Quem traduz reality shows (e não só) certamente já terá dado de caras com diálogos que nos fazem arrancar os cabelos e gritar à pessoa no ecrã: “o que raio queres tu dizer?!” É nestes casos que o ChatGPT nos pode ser útil. Basta dar-lhe o maior contexto possível (dentro dos limites do aceitável, no que toca a acordos de confidencialidade, pois não nos esqueçamos que estamos sempre a alimentar a máquina) e fazer-lhe a pergunta. Muitas das vezes, ele produz uma resposta bastante elaborada (por vezes, até demasiado elaborada).
Outra forma de o utilizar é em reformulações de frases, naquelas situações em que repetimos tantas vezes a mesma frase na cabeça que esta deixa de fazer sentido. Aqui, podemos pedir-lhe uma lista de sugestões. Ele dar-nos-á várias alíneas, cada uma com uma possibilidade. Contudo, escusado será dizer que o que esta máquina debita deve ser aceite com reservas, pois os dados com que está a ser treinada vão até 2021, e muitas das vezes podem ser tendenciosos. Uma contrapesquisa nunca será de menosprezar.
Em suma…
O ChatGPT ainda é um projeto que está a ser desenvolvido e tem muitas arestas a limar. Apesar da ameaça que pode apresentar a muitos postos, cargos e funções, acredito que todos lhe devem dar uma oportunidade, ainda que tenha os seus defeitos. Seja qual for a dúvida, questão ou teima, o ChatGPT é capaz de escrever qualquer coisa… Incluindo, quem sabe, artigos sobre o seu uso na área da Tradução…